18/01/2014
"Escrevi tudo o que sentia numa folha de papel. Uma folha de papel que continha tanto. Uma folha de papel que além de palavras tinha lágrimas. Tinha arrependimento, saudade, vergonha. Tinha o valor que nunca ninguém me deu. Tinha o orgulho que eu sempre quis que alguém tivesse em mim. Tinha a esperança que tudo voltasse a ficar bem. Tinha tudo e tinha nada ao mesmo tempo. Porque eu era nada, e aquela folha tinha todos os pedaços que restavam de mim.
Não consegui ler o que escrevi. Tinha vergonha. Vergonha de mim e das minhas palavras.
Finalmente o medo tinha-se apoderado do que restava do meu ser. Talvez não fosse só o medo. Mas o que é certo, é que o que quer que fosse, tinha-se apoderado de mim. E agora era de vez. Ninguém me ia libertar. Era a última vez que ia sentir toda aquela angústia e todos aqueles sentimentos que me levavam ao desejo de não viver mais.
Rasguei a folha. Não queria que ninguém lesse o porquê de tudo isto. Sentei-me no chão. O que restava da folha permanecia agora à minha frente.
Senti a lâmina a atravessar-me a pele, mais uma vez, tal como o frio que atravessava todos os meus pensamentos. Uma gota de sangue caiu sobre os pedaços da folha rasgada. Senti um alivio enorme e ao mesmo tempo doloroso. O meu coração batia cada vez mais lentamente à medida que o sangue corria pela minha pele e se espalhava no chão. Sorri, ao ver que, finalmente, tudo ia acabar. Não ia mais viver rodeada de solidão, ódios e inseguranças.
Tive medo que aquele golpe, profundo em mágoas e esperanças, não fosse suficiente para dar fim a todo o sofrimento. Então voltei a pegar na lâmina, juntei toda a força que me restava, e fiz um só movimento na vertical que bastou para que a única coisa à minha volta, fosse sangue, as paredes brancas e frias e os pedaços da folha.
Sentia as batidas do coração cada vez mais fracas. A minha respiração leve e cansada era a única coisa que se ouvia naquele momento.
Recordei, por breves instantes, tudo o que de bom passara há uns anos atrás. Uma lágrima pesada e cheia de dor, escorreu-me pelo rosto. Mas logo a seguir, voltei a lembrar-me que todas essas boas recordações nunca chegariam para compensar as más. E que esse era o motivo de eu estar ali agora, sozinha, à espera que o desejado momento chegasse.
Uma escuridão enorme começou a apoderar-se do que restava de mim. Tinha chegado a hora. O meu coração parou de bater e a minha respiração fraca e sumida deixou de se ouvir.
Tudo o que restava agora, no meio daquelas paredes frias, eram o sangue derramado, os pedaços da folha rasgada, o silêncio e o corpo da minha alma perdida."
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